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Je suis un Homme...

Comme ils disent! Onde tudo tem o seu espaço.

Je suis un Homme...

Comme ils disent! Onde tudo tem o seu espaço.

"Terapias de Conversão"

Só um cego é que não vê!

Chegou-me hoje por mensagem de Messenger uma petição para assinar para a ilegalização das “Terapias de Conversão” em Portugal. Confesso que achava que esse assunto estava mais do que despachado neste século em que vivemos. Mas ao que parece não. Parece que ainda vivemos num mundo onde ser-se qualquer coisa relacionado com a sigla LGBT é uma doença que com terapias se convertem em sabe-se lá Deus o quê.

 

Enquanto lia o texto que compõe e justifica essa mesma petição, deparei-me com o facto de ter sido já exibida uma reportagem que falava sobre essas terapias. A reportagem é da Ana Leal e ainda se encontra disponível na internet para quem queira ver ou rever (aqui).

 

Confesso que isto me deixa de alguma maneira chateado e revoltado, sentindo-me incapaz de fazer mais para além de assinar essa petição. Talvez eu possa fazer mais, pedindo a amigos que assinem essa mesma petição e escrevendo aqui na minha página sobre isso mesmo.

 

Ser-se LÉSBICA, GAY, BISSEXUAL, TRANSGÉNERO, entre outras coisas, não é nenhuma patologia, não é nenhum trauma. Durante anos eu lutei contra a minha sexualidade. Lutei porque achava que era errado, que era alguma patologia que existia em mim. Não conseguia compreender porque me sentia atraído por homens, o porquê de as mulheres não mexerem comigo. Cheguei a namorar com algumas mas percebi mais que estava a enganar-me que a ser feliz. Durante anos achei que tinha algum problema, que era errado o que eu sentia e que tinha de lutar contra isso. Posso dizer que foram mais de 10 anos de luta contra isto que eu sentia, 10 anos de dor por não conseguir sentir-me livre. Durante anos eu não era eu, mas sim uma pessoa oprimida, uma pessoa intragável. Isto porque à minha volta só via a forma como condenavam a homossexualidade, a forma como atacavam essas pessoas e as colocavam à margem de uma sociedade supostamente correta mas que está totalmente podre por dentro. Durante anos eu fui infeliz porque via a forma como os homossexuais eram tratados, as piadas constantes em grupos de amigos, as agressões que eles sofriam... tanta e tanta coisa que me fez sentir mal durante esse tempo todo.

 

Quem olha para mim acha que sou super corajoso e tal e coisa. Mas sou também uma fraco em tantas outras coisas. Neste momento eu sinto-me fraco, impotente. Sinto-me triste por saber que uma petição que protege a comunidade LGBT só conta com duas mil e tal assinaturas. Não ligamos a estas coisas, não nos toca. E eu acho isso tão, mas tão errado... Cada um de nós saberá perfeitamente aquilo que sofreu ou não sofreu na sua luta por escancarar as portas do seu armário, para tentar viver de uma forma mais livre possivel.

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Mas eu não luto por mim. Eu estou bem, eu consegui o meu lugar, ainda que ele seja muito apertado. Eu consegui o meu respeito, o respeito dos outros. Eu aprendi a lutar contra os comentários dos outros, aprendi a lutar contra os outros. Eu não luto por mim, eu não escrevo estas palavras por mim. Escrevo-as por quem virá um dia, escrevo por aqueles que ainda nem a luz pelas frestas das portas conseguem ver. Escrevo, luto, tento dar voz por aqueles que quando cá chegarem encontrem um mundo melhor, onde ser-se LGBT é tão igual a outra coisa qualquer. Escrevo porque gostava de ter tido alguém que me tivesse preparado o caminho, escrevo para não esquecer aqueles que abriram caminhos, por aqueles que estão a abrir estradas. Escrevo, talvez porque é a minha única forma de lutar, de dar voz. Escrevo com o coração partido pela falta de união, pela forma como cada um se esquece de forma fácil por aquilo que passou.

 

Ao mesmo tempo que me sinto triste pela falta de união, sinto-me também chateado e triste por não ver psicólogos assumidamente LGBT ou defensores da causa dos mesmos a lutarem contra isto, a serem os primeiros a dar voz, os primeiros a lutar e a incentivar ao fim desta atividade. Chateia-me ver o nome da Igreja Católica nisto, quando ela deveria ser colo de mãe, aceitar as pessoas, caminhar a seu lado, apoia-las. Na verdade muitos de nós andamos de costas voltadas com a Igreja por causa disso mesmo: por causa dos dedos que nos apontam, por causa da descriminação e falta de acompanhamento. Por nos deixarem totalmente à margem, por nos excluirem. Cristo amou tanto prostitutas como pecadores. Deus criou-me como sou. E nunca se deveriam esquecer dos telhados de vidro que têm. Quanto aos amigos psicólogos, este é o vosso campo, esta luta também é vossa e mais do que nós, vocês têm na voz o poder e a força. Nós, os outros, só conseguimos chegar até certo ponto.

 

Deixo aqui o link para a assinatura da petição. Se de alguma maneira isto te sensibilizou ou te fez pensar, abre o link, lê o texto da petição e, no fim, se te sentires confortável, assina. Se a união faz, de alguma maneira, a força, este é o momento certo!

 

https://peticaopublica.com/?pi=PT99948&fbclid=IwAR1oOE4PS5nkc4nZOufV5n19Rlq5K8q6B2XR4Oxguf4CXQOKdHgsFh9KCzI

Das coisas que não falamos...

pela vergonha que sentimos!

Desde que assumi a minha homossexualidade de forma pública, apesar de toda a gente dizer “já sabia” (é interessante como toda a gente sabe sobre tudo e mais alguma coisa), que a vida tem dado uma volta enorme, ou talvez não. A verdade é que eu sinto uma enorme liberdade em não ter que andar escondido (apesar de não o fazer muito), em poder escrever e partilhar sobre tudo o que quero e sinto. Não sou, na verdade, nenhum ativista que anda de bandeira ao peito, mas sei fazer muito bem o meu papel de “bicha” (termo que nós homossexuais podemos usar mas que quem está fora do mundo LGBT não pode, pois é considerado uma ofensa).

 

Apesar de toda esta liberdade e de, com os pés bem assentes na terra, afirmar que sou gay, viver dentro desta suposta comunidade não é algo fácil. Penso que já se devem ter escrito mil teses e mil palavras sobre este assunto, mas é algo que ainda está presente nesta suposta comunidade. Ser-se gay não é fácil, ao contrário do que muitos pensam. Tudo aquilo que irei escrever nos próximos parágrafos é sobre a minha experiência e não quer dizer que todos se sintam de forma igual.

 

Para se ser gay tem de se corresponder a um certo tipo de parâmetros, pelos quais a sociedade nos arruma na gaveta da homossexualidade. Para se ser gay é preciso ter uma certa feminilidade, aqueles “tiques” certos. É preciso usar-se o tipo certo de roupa, ter aquele tipo de timbre certo, andar sempre rodeado de mulheres e adorar compras. É preciso ter-se aquela amiga que conhece outro gay e que acha que são o casal ideal, que se é super sensível e chora por tudo. Para se ser gay também é preciso ter-se aquele tipo de profissão. Caso não se preencham estes requisitos, ninguém desconfia da homossexualidade de ninguém e depois quando saem do armário é sempre uma enorme surpresa (sim, ainda é preciso sair-se do armário).

 

Já dentro daquilo que se chama “comunidade LGBT” também é preciso corresponder-se a certos critérios ou então não fazes parte! É preciso teres os amigos certos, ter o corpo ideal, ser-se bicha qb, usar o penteado da moda, ser bem visto fora da comunidade e pertencer a um certo partido. Tens de ter um estilo não muito extravagante e estar de acordo com tudo aquilo que acontece e contra tudo aquilo que também acontece.

 

Mais uma vez, volto a dizer, isto é o meu ponto de vista, a minha experiência.

 

Esta semana partilhei no meu Instagram uma foto que falava bem sobre a comunidade gay e em como se sofre bulling dentro da comunidade: ou se é muito alto ou muito baixo, muito velho ou muito novo, muito magro ou muito gordo, muito cabeludo ou muito sem cabelo, muito feminino para ser ativo ou muito masculino para ser passivo. E tudo isto vem da comunidade LGBT que continua a dizer: “Sê tu mesmo”. E esta é a forma como realmente vivemos, dentro de uma comunidade que é suposto abraçar em vez de pontapear.

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Não tenho intenção nenhuma de estar para aqui a denegrir a comunidade LGBT. O meu único objetivo é sensibilizar para este assunto, demonstrar em como ser gay não é tarefa fácil, a menos que nasças com os atributos todos no sítio.

 

Relativamente a mim, vou fazer a seguinte análise. Eu tenho 1,78cm, não sou muito alto nem muito baixo. Peso cerca de 65 quilos o que não me torna nem muito gordo nem muito magro. Não tenho um corpo definido, sou careca, tenho barba. O meu estilo escandaliza por onde passo, uso cores, flores, roupa justa e roupa fluída. Odeio a ideia de que a roupa tem identidade de género, pois é só para mulher e só para homem. Leio bastante, tenho uma curiosidade nata, canto umas coisas, toco outras. Vou à missa ao domingo, bebo copos à noite. Tenho o meu qb de feminino e uma dose extra de bichesa. Uso chapéus e bijuteria, tenho botas com saltos e ando de mala. Acredito que distâncias são apenas pormenores e estou sempre disponível para fazer uns quantos quilómetros para estar na companhia de alguém que me interessa. Vou a bares gay e a discotecas (sejam friendly, LGBT, seja uma qualquer). Tenho as minhas ideias, os meus ideais, os meus gostos e coisas que desprezo. Seria um hipócrita se dissesse que não tenho o meu gosto relativamente a outras pessoas, aquilo que mais me atrai ou aquilo que não me diz nada. Como qualquer pessoa normal. A acrescentar a isto tudo estão implícitos outros três aspetos que não podem (nem deixam) ser esquecidos: estive num seminário, tive cancro (e isso está visível no ser careca e no implante que tenho no peito) e fui para a televisão dizer que era homossexual (se tivesse sido no Big Brother ou Casa dos Segredos ou algo assim, já seria diferente).

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Infelizmente ainda há quem olhe para mim como um ser alienígena, alguém que não é deste mundo. Não se preocupem, eu também acho isso. O meu tempo não é este ou talvez seja mesmo. Não digo que fui sempre a melhor pessoa à face da terra. Isso seria uma autêntica mentira. Também já tive a minha fase, também já cometi os meus erros. Claro que eu também não gosto de algumas pessoas, das suas atitudes ou da forma como se comportam. Mas sei onde termina a minha liberdade e começa a liberdade do outro.

 

Sempre idealizei uma comunidade LGBT como forma de apoio, de suporte, de ajuda. Onde realmente pudéssemos ser quem verdadeiramente somos, sem julgamentos ou olhares discriminativos. Um espaço onde pudéssemos ter voz e assim fazer uma voz junta, uma voz forte. Um local de compreensão, onde tivéssemos braços abertos para nos acolher, como um colo de mãe. Mas esta não é a realidade, pelo menos a que eu vivo, onde vivo. Tenho uma prole que me aceita da maneira que sou. Quanto ao resto eu vou continuar a sonhar, continuar a lutar e a continuar a estar de braços abertos para acolher quem precisar, ouvir quem necessitar, ajudar quem quiser se ajudado.

 

Ser-se homossexual não é fácil, mas quando passas as estribeiras ainda pior. Felizmente conheço casos que salvam a norma e isso deixa-me de certa forma consolado. Mas ainda há muito trabalho a fazer. Juntos seríamos mais fortes, se todos o quisessem...